Ao buscarem planetas em formação, cientistas acabaram se deparando com o nascimento de um nova estrela
Os cientistas estavam só em busca de uma formação semelhante ao nosso Sistema Solar, com o objetivo de encontrar a 11 mil anos-luz da Terra uma jovem estrela com os planetas em formação ao seu redor.
Vale lembrar que em termos astronômicos, ver o céu é sempre observar o passado. Ou seja: ao olhar para um lugar a 11 mil anos-luz da Terra, os cientistas estão observando luzes emitidas há 11 mil anos.
Mas quando os astrônomos analisavam a estrela MM1a e observavam o que estava ao redor dela, tentando compreender a possível formação de planetas em um sistema, tiveram a surpresa: não se tratava de uma estrela, mas de duas. MM1a não está sozinha, tem a companhia da pequena MM1b.
Ou seja: em vez de observarem planetas em formação, acabaram se deparando com o nascimento de uma nova estrela. Esta é a principal conclusão de um estudo publicado nesta sexta no periódico Astrophysical Journal Letters.
"A MM1a é um dos exemplos mais claros de uma jovem estrela massiva que pudemos observar até hoje. De fato, é tão massiva - tem cerca de 40 vezes a massa do nosso Sol - que acreditamos que o disco em torno dela desmoronou sob seu próprio peso, formando a companheira MM1b", explicou à BBC News Brasil o astrônomo John Ilee, pesquisador da Escola de Física e Astronomia da Universidade de Leeds, da Inglaterra.
"Havia muito material disponível no disco em colapso. Em vez de crescer para a massa de um planeta, o MM1b foi capaz de crescer muito mais - para pouco mais de metade da massa do nosso Sol", completa o cientista.
Essas conclusões foram obtidas depois de Ilee e sua equipe chegarem, graças a dados captados pelo radio-observatório Alma, do Chile, a uma das visões mais detalhadas já feitas de uma jovem estrela até hoje.
O nascimento de uma estrelinha
O objeto principal, MM1a é uma jovem estrela massiva cercada por um disco rotativo de gás e poeira. MM1b, descoberta nas proximidades, foi detectada logo depois desse disco rotativo - seria um raro, até o momento, exemplo de sistema binário em que há um disco entre as duas estrelas.
Descoberta é um raro exemplo de sistema binário em que há um disco entre as duas estrelas
Ilee explica que o sistema está em formação, já que as estrelas são resultantes justamente de aglomerações densas de grandes nuvens de gás e poeira espacial.
"Quando essas nuvens sucumbem à gravidade, elas começam a girar mais rápido, formando um disco ao redor delas. Em estrelas de baixa massa como o nosso Sol, é nesses discos que os planetas podem ser formar", compara o cientista. "No caso observado, estrela e disco são tão massivos que, em vez de testemunhar um planeta se formando no disco, estamos vendo outra estrela nascer."
Para concluir o tamanho de cada estrela, os cientistas mediram a quantidade de radiação emitida e observaram as mudanças sutis na frequência de luz da nuvem de gás. A estimativa é que MM1a pese 40 vezes a massa do nosso Sol. Já a pequena MM1b tem cerca de metade do Sol.
Isto é intrigante. De acordo com Ilee, em sistema binários o mais comum é que ambas as estrelas tenham massas semelhantes - indicando que foram formadas em conjunto. "Encontrar um sistema binário jovem com uma razão de massa de 80 para 1 é muito raro. Isto sugere um processo de formação totalmente diferente para os dois objetos", comenta o astrônomo.
"Um processo assim era previsto apenas em modelos teóricos e computacionais. O conjunto MM1a e MM1b é o primeiro exemplo descoberto 'na natureza' para jovens estrelas", afirma Ilee.
Uma hipótese interessante lançada pelos cientistas é que o sistema pode vir a ter planetas no futuro - mas estes devem gravitar a irmã menor, a MM1b. Eles acreditam que ela também esteja cercada por um próprio disco, com potencial para a formação de astros.
Conforme explica Ilee, estrelas "tão massivas como a MM1a só vive por um milhão de anos antes de explodir em poderosas supernovas". A menor MM1b, por sua vez, tem potencial de formar o próprio sistema planetário no futuro.
O Alma
Sigla para Atacama Large Milimeter Array, o Alma é um rádio-observatório espacial em funcionamento desde 2011 no deserto do Atacama, no Chile.
O conjunto de 66 antenas do Alma permite observar os confins do universo, inclusive galáxias muito distantes
Está instalado a uma altitude de 5 mil metros e é administrado por uma parceria firmada entre países da Europa, Ásia, América do Norte e o próprio Chile.
O conjunto de 66 antenas - as 54 maiores com 12 metros de diâmetro - permite observar os confins do universo, inclusive galáxias muito distantes. O telescópio começou a ser construído em 2003.
A equipe de Ilee utilizou os 66 pratos das antenas simultaneamente, em um processo que é capaz de simular um único telescópio que teria 4 quilômetros de diâmetro. Em 2019, esse grupo de cientistas deve continuar utilizando o Alma.
"O Alma é capaz de simular o poder de resolução espacial de um telescópio com quilômetros de extensão. Isso nos permite sondar fragmentos extremamente pequenos a grandes distâncias da Terra, detectar a fraca emissão de poeira e gás ao redor dessas jovens estrelas e caracterizá-las em detalhes", diz Ilee.
Fonte: BBC News