Às 19h do domingo de eleições, assim que a votação acabou no Acre e a contagem de votos passou a ser acompanhada em todo o país, a pesquisa de boca de urna do Ibope para a Presidência da República foi divulgada em rede nacional: haveria segundo turno entre Jair Bolsonaro, com 45% dos votos válidos, e Fernando Haddad, com 28%.

Horas depois, o resultado oficial apontava um placar extremamente parecido: 46% x 29%. Se por um lado os números da boca de urna foram certeiros, por outro diferiram dos cenários apontados pelas pesquisas anteriores. Na véspera das eleições, por exemplo, o Ibope mostrava Bolsonaro mais fraco, com 41% de votos válidos.

Isso quer dizer que as pesquisas erraram? A resposta é não, diz Márcia Cavallari, diretora executiva do Ibope Inteligência, responsável pelas pesquisas de opinião. O que aconteceu, na verdade, diz Cavallari, é que "o eleitor decide o voto cada vez mais tarde".

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"Muita gente fica falando que isso é desculpa dos institutos, mas isso é real. É só você entrevistar as pessoas na rua e perguntar quando elas decidiram o voto. Muita gente decidiu na última hora. Eu, por exemplo, decidi em quem ia votar para deputado e senador quando estava saindo de casa para votar. Os eleitores estão fazendo isso mesmo".

Já nas eleições estaduais, as surpresas foram ainda maiores, como mostra o caso do candidato a governador do Rio de Janeiro Wilson Witzel (PSC), apoiador de Bolsonaro. Na véspera da eleição, as pesquisas lhe davam 12% dos votos válidos. Na boca de urna, 39%. Witzel terminou o pleito com 41% e disputará o segundo turno com o ex-prefeito carioca Eduardo Paes (DEM).

Outra questão que pode ter influenciado as discrepâncias entre pesquisas e resultado é a influência de redes sociais e, principalmente, do WhatsApp. "Isso também faz com que o eleitor possa mudar sua opinião instantaneamente. Então, é outro fator que contribui para explicar essas movimentações bruscas de última hora."

Essas mudanças são cada vez mais rápidas e deixam para trás os resultados das sondagens anteriores. "As pesquisas não têm o papel de prever quem vai ganhar a eleição. Elas têm o papel de mostrar a situação do eleitor naquele momento."

Veja abaixo trechos da entrevista da BBC News Brasil com a diretora do Ibope:

'O eleitor decide o voto cada vez mais tarde. Isso foi ainda mais forte para as eleições de governador e senador', diz Márcia Cavallari, do Ibope

As pesquisas realizadas alguns dias antes do pleito falharam sobre a intenção de voto de Bolsonaro ou o candidato cresceu na reta final?

Márcia Cavallari - As pesquisas foram captando, sim, todo o crescimento que Bolsonaro teve ao longo da campanha. Assim como também captaram todo o crescimento de (Fernando) Haddad. O que houve foi um esvaziamento de outras candidaturas, que fez com que tanto Bolsonaro quanto Haddad chegassem ao patamar que chegaram. O esvaziamento das candidaturas do (Geraldo) Alckmin, da Marina (Silva), até do Alvaro Dias. O único que não esvaziou foi o Ciro Gomes.

É comum que a intenção de voto mude tanto na reta final?

Cavallari - Isso sempre acontece, mas está aumentando. O eleitor decide o voto cada vez mais tarde. Deixa para o último dia. Isso foi ainda mais forte para as eleições de governador e senador, porque a eleição presidencial puxou a atenção do eleitor e ele deixou para segundo plano as demais decisões. Isso gerou as viradas que vimos no Rio de Janeiro e em Minas Gerais, por exemplo. O que explica isso é o processo decisório do eleitor.

Muita gente fica falando que isso é desculpa dos institutos, mas isso é real. É só você entrevistar as pessoas na rua e perguntar quando elas decidiram o voto. Muita gente decidiu na última hora. Eu, por exemplo, decidi em quem ia votar para deputado e senador quando estava saindo de casa para votar. Os eleitores estão fazendo isso mesmo.

Como as redes sociais e o WhatsApp impactam a intenção de voto?

Cavallari - A questão do WhatsApp e das redes sociais foi vista de forma mais contundente nas eleições 2018. Isso também faz com que o eleitor possa mudar sua opinião instantaneamente. Então, é outro fator que contribui para explicar essas movimentações bruscas de última hora.

Além disso, o WhatsApp não é uma plataforma que possa ser analisada (as conversas no app são privadas e limitadas a 256 pessoas, não sendo possível saber o que está sendo compartilhado). Já no caso do Twitter e do Facebook, a gente até consegue analisar, mas o WhatsApp, não.

Isso é um desafio para os institutos de pesquisa?

Cavallari - As pesquisas não têm o papel de prever quem vai ganhar a eleição. Elas têm o papel de mostrar a situação do eleitor naquele momento. Hoje, quando a gente divulga a pesquisa, ela já está velha. Porque a dinâmica da eleição é muito grande. Fatos novos acontecem toda hora, o debate está fervendo, denúncias aparecem, a imprensa divulga, as pessoas compartilham. Para tomar sua decisão, o eleitor leva tudo isso em conta como fonte de informação.

Assim, o que a pesquisa retrata é aquele momento: com aquele conjunto de informações, naquele contexto, a opinião das pessoas é aquela. Se muda o contexto, as pessoas podem mudar de opinião. Quando a gente faz uma pesquisa, a gente não faz o entrevistado assinar um papel dizendo que ele não vai mudar de ideia.

Fonte: BBC News Brasil

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